Manejo sustentável de alevinos do Aruanã é autorizado no Amazonas

Publicado em:  8 de Janeiro de 2024

Estratégia de conservação do Instituto Mamirauá é inédita no Brasil e visa inibir a exploração comercial ilegal e predatória da espécie para fins ornamentais

Após mais de dez anos de pesquisa científica conduzida pelo Instituto Mamirauá, o primeiro manejo sustentável desta espécie no Brasil para fins ornamentais foi autorizado. A autorização foi dada pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM) e deve ter início este ano de 2024. Com isso, os pescadores da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, unidade de conservação a cerca de 640 km de Manaus, estão se preparando para o primeiro manejo.

A captura de larvas e alevinos (filhotes) de aruanãs para fins ornamentais era proibida no Amazonas. Por outro lado, o comércio ilegal e de alto impacto ambiental seguiu atuando. Mas, com base nas experiências e dados coletados pelo Instituto Mamirauá, uma resolução da Secretaria Estadual de Meio Ambiente aprovou a pesca de larvas e alevinos, quando dentro dos protocolos e princípios sustentáveis do manejo. O Instituto Mamirauá é uma referência internacional em manejo sustentável. O caso da espécie de peixe pirarucu é emblemático: de 1999, quando iniciou o manejo em parceria com as comunidades ribeirinhas, para cá, a população de pirarucu, antes ameaçada de extinção pelas atividades não sustentáveis, cresceu 620%.

A espécie Aruanã também está na lista dos peixes mais consumidos no Amazonas. Entretanto, a particularidade desse peixe vai além da alimentação, pois, quando filhotes, os aruanãs são observados pelo mercado de ornamentais.

Como parte dos preparativos para a pesca sustentável que deve ocorrer entre 1º de fevereiro e 31 de março de 2024, o Instituto Mamirauá e pescadores do município de Maraã devem realizar, ainda em janeiro, a contagem de aruanãs em lagos da região. Os aruanãs adultos medem a partir de 50 cm, tamanho médio de maturação sexual. Abaixo disso, os peixes são considerados juvenis. O levantamento será realizado pelos pescadores da colônia local experientes na contagem e que vem se preparando há anos para este manejo.

A contagem realizada integra os estudos sobre a ecologia e a biologia de aruanãs conduzidos pelo Instituto Mamirauá. As pesquisas são feitas há mais de uma década nessa região e deram sustentação científica para o plano de manejo da espécie, proposto ao IPAAM.

A resolução permite a pesca em áreas de manejo, com apresentação de plano de uso sustentável, relatório técnico e histórico de no mínimo 3 anos de contagens já realizadas.

A metodologia de contagem praticada em lagos da Reserva Mamirauá foi inspirada em experiências feitas no Peru, onde a comercialização de aruanãs na categoria de peixes ornamentais já é uma realidade há muitos anos.

Adicionando critérios técnicos à atividade e com adaptações ao contexto local, os pesquisadores do Instituto Mamirauá chegaram ao modelo atual: à noite, durante a estação de seca (em média, de agosto a novembro), os pescadores fazem a contagem visual de aruanãs em lagos de água preta.

Divididos em duplas e guiados por lanternas de cabeça, os pescadores saem em canoas e percorrem, lado a lado, toda a extensão do lago, de uma cabeceira a outra. Na proa, vai o contador e atrás o anotador, registrando em uma planilha os aruanãs que forem contabilizados no caminho. As canoas ficam emparelhadas a uma distância de 5 metros entre elas, e seguem a uma velocidade média de 2 quilômetros por hora (km/h). A velocidade é controlada por um dos pescadores com o uso de GPS.

O contraste entre o tom escuro e límpido das águas e os olhos e escamas do aruanã, que refletem a luz, permite a visualização. A contagem é feita à noite porque o aruanã é um peixe de superfície e dá para se ter uma boa visualização dele com o foco de uma lanterna.

Os alevinos e larvas, valorizados no mercado de ornamentais são contados a partir da boca dos machos da espécie. Entre os aruanãs, é o macho que cuida dos filhotes, guardando a prole na boca até um certo estágio de vida. Quando a boca do peixe está entreaberta, o contador consegue ver a coloração do filhote e distingue em qual fase de desenvolvimento ele se encontra. A partir de 5 cm (centímetros), é permitido o manejo de ornamentais.

Para confirmar o que foi contado, a equipe faz o que é chamado de despesca ou “arrasto”. Assim como no manejo do pirarucu, partes do lago são fechadas com redes de pesca e, após a contagem, os pescadores retiram todos os peixes do ambiente. Essa é uma metodologia de baixo custo e eficaz para estimar a população local de aruanãs e possibilita o manejo da espécie.

Para a captura dos adultos e filhotes, o método de pesca será o puçá manual. O puçá é direcionado na frente do peixe com auxílio da lanterna de cabeça para que o mesmo adentre e seja capturado em seguida. Este apetrecho conta com um sistema de fechamento que impossibilita a fuga. O peixe é mantido dentro da água até a preparação para retirada dos filhotes. O puçá captura com sucesso o peixe e reduz a quantidade de ferimentos no corpo do indivíduo quando comparado com outros métodos de captura (rede de espera, rede de arrasto, anzol e/ou arpão) e de manipulação dos filhotes. A cota autorizada para 2024 é de 15.000 alevinos que representa um pouco menos de 0,05% do total de filhotes estimados nos estudos.

Entre os diversos objetivos do Plano de Manejo para a espécie estão: I) estabelecer diretrizes e princípios, bem como, procedimentos para contagem e captura; II) garantir um manejo de uso múltiplo (alimentação e ornamental) com vista a oferecer novas oportunidades de produção e geração de renda aos pescadores e suas famílias por meio da comercialização legal; e III) conservar as populações naturais de aruanãs e protegê-las contra a exploração não-sustentável, gerando condições favoráveis à proteção e sobrevivência da desova, garantindo o recrutamento natural e a disponibilidade de fontes de alimento nas áreas de manejo.

Texto: Ana Claudia Torres

Últimas Notícias

Comentários

Receba as novidade em seu e-mail: